Os Erros a Aprender Matemática
O ensino da matemática é o principal responsável pela popularidade da mesma. A maneira como é transmitida durante a escola torna a sua aprendizagem ineficiente e pouco proveitosa. Aprender Matemática é fundamental pela transversalidade em qualquer domínio profissional. Neste artigo exploramos brevemente o estado do ensino da matemática, revendo os principais erros cometidos e partilhamos algumas ideias para aliviar o estigma negativo à volta dela.
O ensino
É difícil dissociar uma discussão sobre a aversão à matemática da forma como ela é ensinada. A ideia principal que vinga em Portugal, por exemplo, é a de que se consegue colocar cada vez mais matéria nos programas escolares para que os jovens fiquem “melhor preparados”. Esta abordagem resulta num programa excessivamente extenso [1].
O que se entende como jovens melhor preparados? Ao que parece a definição de quem desenha os programas curriculares é a de ser simplesmente exposto a uma quantidade enorme de matéria num curto período. “Atirar o barro à parede”, é o que me lembro. Expõe-se uma quantidade enorme de matéria aos alunos – que estão em diferentes níveis e ritmos de aprendizagem – e espera-se que esta “fique”. O que ficar sabido ficou, o que não, fica para a próxima oportunidade, o comboio não espera por ninguém. E para aprender matemática eficientemente, as coisas não são bem assim.
É neste ponto que muitos alunos começam a criar uma antipatia pela matemática. Se alguns destes alunos tiveram mais dificuldades a compreender um ou outro conceito e esse conceito é presente em teste, independentemente se se erra ou não, passa-se ao tema seguinte. Se o aluno sabe, é lhe confirmado que sabe, se não sabe fica com essa lacuna. O habitual é tocar muito pouco naquilo que se fez de errado e que ficou para trás, desde que não saia no próximo teste.
O mérito é o teste e o estudar para o teste. Com este ambiente entende-se porque é que o gosto dos alunos por aprender desaparece aos poucos. Na escola, aprender não é um fim em si mesmo. É apenas um meio para atingir outro fim, uma boa nota, aceder a um curso com empregabilidade, ser bem-sucedido (seja lá o que isso for). Assim, o objetivo é maximizar a nota que se tem no teste, o que não se alinha necessariamente com o maximizar a aprendizagem.
Preparam-se os alunos com “testes-tipo”. Se sem estes, a tendência já é memorizar, com eles, os alunos decoram quase todas as palavras e nuances do teste-tipo e esquecem-se de aprender. Como o tempo disponível dos professores é escasso, fazem-se testes praticamente iguais aos exemplos. Esta estratégia perpetua uma memorização de conceitos arbitrários e demasiado específicos para aquele tipo de avaliação, que pouco se conseguem relacionar com tudo o que foi aprendido para trás.
Não quero entrar muito nos detalhes de porque é que este tipo de programas além de desadequado está condenado ao fracasso e desvirtua completamente o propósito de uma escola e do acesso ao ensino. Quero dar ênfase sim à forma como eu gostaria de aprender matemática que coincide em grande parte com a forma como eu a explico aos meus alunos.

Outra visão
As minhas primeiras experiências com a matemática eram numa base de aprender mais uma matéria, tal como aprendia História ou Biologia. Era uma disciplina diferente das outras, e isso despertava curiosidade, mas não deixava de ser mais uma para decorar, só porque sim. Só mais tarde no final do secundário e durante a universidade que comecei a perceber realmente a sua importância e “a sua piada”.
Aos meus alunos tento sempre aliviar o desespero de sentirem a inutilidade de muitos dos conceitos que aprendem na escola. Grande parte daquilo que nos obrigam a aprender na escola é inútil. Completamente inútil. No seu dia-a-dia, quando é que foi a última vez que precisou de saber em que ano nasceram os filhos de D. Sancho I e quais os seus nomes? Ou calcular a probabilidade de se sentar ao pé do seu melhor amigo no cinema, se se sortearem os lugares? Isto são perguntas que saem em testes, no entanto, são meros factos que na prática não o ajudam em nada (a não ser que participe num concurso de cultura geral).
O famoso problema de alguém que quer montar uma vedação e não sabe quantos metros de rede tem de comprar. Ninguém vai comprar exatamente os metros que calculou. O essencial aqui é ter uma ideia, comprar um bocado e se sobrar, vender ou guardar, se não chegar, comprar mais. Deverá interiorizar sim, as noções de perímetro, área, comprimentos, etc.
Um facto curioso, e que causa sempre risos quando estou entre amigos, é o de ser mau em cálculo mental. Desde conferir trocos – em que demoro mais do que a pessoa média a chegar ao resultado – como fazer contas rápidas de cabeça. Uma vez, um deles, na fila para o café na faculdade disse bem alto: “como é que é possível, conseguires resolver equações diferenciais de cabeça e a fazer trocos, atrapalhas-te?” Após uns olhares perplexos na minha direção, sorri encavacado e dei-lhe as moedas para ele contar.
Afinal ser-se bom a matemática não envolve ser-se bom a fazer contas? Bem, mais ou menos. Sem querer puxar o tópico a meu jeito, são duas habilidades bem distintas. Matemática, em nível mais avançado, tem poucos números e pouca aritmética – somar, subtrair, etc. Aí, o que conta são os símbolos que podem representar as quantidades, conjuntos ou funções. Portanto, o raciocínio lógico da relação entre estes objetos e as deduções que se fazem são o mais importante, bem como a criatividade de se juntar conceitos aparentemente afastados.
Fazer contas, de certo modo, é memorizar tabelas. Há que saber alguns algoritmos que tornam as contas mais simples, por exemplo, saber que calcular 380/20 é mais simples fazer primeiro 380/2 (divisão por dois é “fácil”) e depois 190/10 (divisão por 10, é “tirar um zero”) = 19. Memorizar as somas e subtrações de inteiros de um algarismo também é essencial. Para aprender matemática numa vertente mais abstrata, e fugir às instâncias – onde se usam números – começa-se a perder essa agilidade mental em cálculo aritmético.
Assuntos finais
Aprender matemática traz-lhe a estrutura de raciocínio essencial para resolver problemas. Essa capacidade geral de resolver problemas, é construída a partir de outras mais específicas que se aprendem ao lidar com problemas matemáticos. Não são as fórmulas e os problemas específicos que aparecem que são essenciais na matemática. São as estruturas, a lógica, o abstrato que servem de ferramentas para resolver infinitos outros problemas.
O pensamento abstrato foi essencial para a evolução do ser humano. Conseguir encontrar relações entre objetos ou encontrar padrões no seu meio ambiente. Antes de se inventar a roda, começou-se por descobrir a propriedade que objetos arredondados tinham, “deslizavam melhor”. Ao descobrir-se esta propriedade genérica do que deve constituir uma roda, começou-se a generalizar e a construir rodas ajustadas ao propósito que deveriam servir. Ou seja, uma roda não era um objeto circular, feito de madeira maciça com exatamente dois pés de diâmetro. O conceito abstrato de roda, tanto tem dois como quarenta pés de diâmetro. Pode ser de madeira, de pedra, ou metálicas com borracha em volta.
Esta foi uma pequena abordagem de alguns dos erros tipicos que têm sido feitos principalmente no ensino da matemática. Como esse é o principal meio onde se aprende a disciplina, tem um impacto enorme da percepção da mesma. Como tal, é necessário total cuidado para que os alunos não recusem aprender uma das ferramentas mais poderosas e relevantes para o futuro próximo.
Pontos a reter
- Demasiada matéria no ensino da matemática em Portugal.
- Desconexão entre o ensino dos vários conceitos das diferentes áreas da matemática.
- Decorar para os testes é expediente para ter boas notas mas não para aprender matemática.
- Inutilidade em decorar factos em vez de treinar raciocínio lógico.
- Saber fazer contas é diferente de saber matemática.
- Pensamento abstrato enquanto impulsionador do desenvolvimento humano.
Atentamente,
André

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Referências:
[1] [https://clube.spm.pt/news/4350]
Revisto por: Martim
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